sexta-feira, 1 de novembro de 2019

Bancos - Actividade vulturina


BANCOS

Primeiro, com dinheiro emprestado, constituem uma sociedade financeira: registo, marca, logótipo, publicidade, sede social, delegações, equipamentos, tudo é conseguido a crédito com a prestimosa colaboração de gestores de outros Bancos (que assim se tornam, oficiosamente e sem quaisquer encargos, sócios e accionistas do novo Banco).

Depois admitem pessoal para preencher os lugares indispensáveis: caixas (em regime de escravatura, ou seja, a "recibo verde"), "promotores" (isto é, vendedores de banha da cobra que ganham por lebre consoante os gatos que vendem), administrativos (escravos), vigilantes e pessoal de limpeza em regime de "outsourcing". Se a coisa resultar, o novo Banco pagará (quando ou se calhar) as despesas iniciais; se não resultar, abrem falência, não pagam nada a ninguém e repetem o processo sob nova designação e com outro logótipo.

E pronto, sem nenhum dos auto-nomeados gestores ter gasto um único cêntimo do seu dinheiro, temos mais um gang bancário no "mercado".

O resto do processo é conhecido:

1. Recebem depósitos sobre os quais não pagam juros mas dos quais exigem "despesas de manutenção", cobrando taxas e taxinhas sobre todos os movimentos que os "clientes" (otários) fizerem com o que antes era o seu dinheiro mas que agora passou a ser dinheiro do Banco.
2. Com o dinheiro dos depósitos "concedem" empréstimos, sobre os quais cobram juros exorbitantes (e "despesas" e mais taxas e taxinhas).
3. Com os juros cobrados fazem mais empréstimos e assim, rapidamente, multiplicam os lucros iniciais.
4. Assim que os montantes conjuntos de depósitos e de juros cobrados ultrapassar a fasquia da "auto-sustentação" (já com lucro), usam uma parte do bolo para especular nos "mercados". Do que pode resultar uma de duas coisas:

- ou a especulação resulta, e nesse caso os gerentes empocham os lucros;
- ou a especulação não resulta, e nesse caso o Banco abre falência, ficando os clientes com o encargo da dívida do Banco, e os gerentes do ex-Banco ficam com o dinheiro dos depósitos, dos juros, dos pagamentos vencidos e até do apuro da hasta pública de instalações e equipamentos.




quinta-feira, 12 de setembro de 2019


INVESTIGAÇÃO CRIMINAL EM PORTUGAL


(excertos de autos elaborados pela GNR e PSP, peças processuais e
diligências)

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 - Um agente da PSP desloca-se à residência de um casal que anda
desavindo e escreve no auto de notícia que: "o sr. x anda muito
frustrado porque pagou cerca de 5 mil euros pelos implantes mamários da
sua mulher e suspeita que outro cidadão está a usufruir desses
dividendos".
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 - Escrevia um PSP num auto de notícia:"Numa acção de fiscalização,
estando eu de arvorado ao carro patrulha, mandei parar o veículo supra
identificado e pedi ao condutor os documentos pessoais e da viatura. Em
resposta, disse-me aquele que se o autuasse me iria ao cú, o que fez
três vezes."
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 - A GNR participa acidente e explica que "naquele local o asfalto da
estrada era de terra batida".
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 - O gatuno era "herdeiro e vozeiro naquele tipo de condutas".
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 - Auto de notícia em que se diz que a ofendida foi encontrada em "lã-jeri".
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 - O arguido era "de raça nómada".
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 - Auto de notícia em que a GNR denuncia o furto de 24 galinhas das
quais uma era galo.
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 - O arguido resolve acabar o seu requerimento de uma forma cordial: "
Pede deferimento" e logo a seguir ... "As minhas sinceras condolências".
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 - "O denunciado proferiu vários impropérios na Língua de Camões e
também em língua francesa"
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 -"O individuo trazia o produto estupefaciente junto do órgão genital
masculino vulgo pénis"
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 - Diligência de inquérito: "Solicite à PSP que, em 48h, diligencie por
identificar o denunciado que se sabe ter cerca de 16 anos e usar boné"
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 - Quem comete o crime de "borla" é um "borlista" profissional.
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 - Auto de denúncia : "enquanto proferiam tais ameaças permitiam-se
ainda chamar nomes ofensivos tais como "puta, vaca, jornalista,
advogada, ladra, que era boa era para ir para a Ordem dos Advogados".
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 - Um arguido antes de bater no ofendido atirou-lhe com uma caixa em
plástico, "nomeadamente um tampa-roer".
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 - "O arguido atirou um paralelo-i-pípado".
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 - "O arguido trazia uma techerte azul às riscas".
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 - "Os meliantes colocaram-se em fuga, ao volante de uma Picap"
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 - Na sequência de uma queixa por crime de furto de um veículo a GNR
informa que recuperou a dita viatura no entanto a mesma vinha cheia de
moças.
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 - Caso de uma averiguação de causa de morte em que foi determinada a
"autópsia parcial" do cadáver.
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 Exmo Sr. Procurador
 Venho comunicar a V. Exa. que na EN que liga Penamacor ao Sabugal foi
encontrado um cadáver morto, que pela fala parece ser espanhol.

quarta-feira, 21 de agosto de 2019

O preço dos combustíveis em Portugal


Em Portugal mais de metade do preço de venda dos combustíveis resulta de taxas e  impostos, sendo o Imposto Sobre os Produtos Petrolíferos (ISP) o que representa a maior fatia do valor pago. Se tivermos em conta que a média salarial dos portugueses é das mais baixas da Europa, percebemos como o Estado se aproveita dos cidadãos para sacar o mais possível, tudo isto a juntar aos mais altos impostos de sempre. Revoltante !





sábado, 10 de agosto de 2019

Tenente Adriano Francisco Bomba, piloto da Força Aérea de Moçambique



Em 8 de Julho de 1981, o tenente Adriano Francisco Bomba, piloto da Força Aérea de Moçambique, a bordo de um avião MIG-17, penetrou no espaço aéreo da República da África do Sul, foi escoltado por caças sul-africanos Mirage até aterrar na Base Aérea de Hoedspruit, cerca de 320 quilómetros a nordeste de Pretória, onde solicitou autorização de residência. Dias depois o tenente Bomba concedeu uma conferência de imprensa na base da Força Aérea Sul-Africana de Hoedspruit, onde explicou as razões da sua atitude. 

Adriano Bomba foi um aluno brilhante na Escola Industrial, viveu no Bairro do Fomento, na Matola, e jogou futebol, como médio, no Sporting Clube de Lourenço Marques.




A sua fuga de Moçambique foi organizada pelo seu irmão Boaventura Bomba, ligado aos serviços secretos sul africanos e aos elementos da comunidade portuguesa na África do Sul que apoiavam a Renamo. Na África do Sul não foi tratado ou considerado como um prisioneiro de guerra, porque a África do Sul não estava em guerra com Moçambique, e foi-lhe concedido asilo político. O MIG 17, que não se encontrava nas melhores condições (um dos canhões estava inoperacional e os pneus estavam completamente degradados), foi devolvido a Moçambique.


O tenente Adriano Bomba a prestar declarações às autoridades sul-africanas


Os sul africanos pediram que os irmãos Bomba fossem integrados na Renamo e,  após muitas pressões. o presidente da Renamo, Afonso Dhlakama, inicialmente relutante, aceitou a integração.


Pilotos sul-aficanos em pose frente ao Mig-17 de Adriano Bomba


Boaventura Bomba, já com o cargo de Comissário Político da Renamo, acabou por ser executado num campo militar sul africano na Namíbia, em circunstâncias pouco esclarecidas;  segundo o Brigadeiro sul -africano Van Niekerk , Orlando Bomba foi acusado pelo assassinato de Orlando Cristina , secretário-geral da Renamo e foi levado para o Corredor de Caprivi (Namíbia), na altura ainda sob administração sul-africana, tendo sido submetido a julgamento militar e executado a bordo de um helicóptero, tendo o seu corpo sido lançado ao mar ao largo da costa namibiana.

Após a assinatura do Acordo de Romade 1992, Afonso Dhlakama declarou à comunicação social em Maputo que Adriano Bomba “havia morrido” sem adiantar mais pormenores. De acordo com membros da Renamo, Adriano Bomba terá morrido durante uma emboscada.

O que se segue é a transcrição dum extracto das respostas dadas por Adriano Bomba, depois publicadas pelo jornal sul africano “Panorama” e replicada por outros meios de comunicação da época.


Pergunta:
O facto de ter trazido consigo um avião MIG I7 representa um acto de guerra particular contra o sistema em Moçambique?

Resposta:
Utilizei o avião como simples meio de transporte, mais nada. Um meio de transporte mais eficaz. Sei que aquele avião não pode ser utilizado contra a Frelimo. Porquê? Porque sei que não sou o primeiro piloto que foge de um país num avião de guerra. Sei que depois disto tudo, o avião irá de volta. Isto já aconteceu com um piloto soviético que saiu da URSS num MIG-25, aterrou no Japão e depois seguiu para os Estados Unidos. Depois de ter sido estudado e todo desmontado, o MIG-25 foi reenviado para a União Soviética.

Pergunta:
Disse que se sentia mais útil a Moçambique fora do país, do que na situação em que ali se encontrava. Quer ser mais explícito sobre este aspecto?

Resposta:
Em Moçambique, quando estava a estudar, tinha em mente tirar um curso, o meu curso. A importância que vejo nele não é unicamente nacional, resulta da importância que esse curso ocupa no campo científico, e a ciência para mim não tem nacionalidade. Aquilo que eu pudesse fazer no campo da ciência poderia beneficiar Moçambique, pelo menos a longo prazo. O facto de não ter podido segui-lo demonstra que as pessoas em Moçambique não se desenvolvem. Porquê? Porque não têm o direito de optar. Quando um indivíduo opta, é muito mais dedicado à sua causa.

Pergunta:
Teria a sua deserção surpreendido os seus camaradas de armas de Moçambique?

Resposta:
Penso que os meus colegas, principalmente os da Força Aérea, não se admiraram daquilo que eu fiz, porque os nossos ideais convergem. Mas tomar a decisão que tomei é coisa que tem muito mais importância e é muito mais difícil. Este meu acto vai despertar muita gente; tenho consciência de que muitas mentalidades adormecidas vão despertar por causa deste meu acto.

Pergunta:
Com um acto de ousadia quase agressiva, modificou subitamente o curso de seu destino. Como antevê o desenrolar desse destino?

Resposta:
Os meus planos são aumentar os meus conhecimentos na África do Sul.

Pergunta:
Não receia que a sua família em Moçambique esteja agora em perigo?

Resposta:
Não penso que a minha família esteja em perigo. Porquê? Porque as autoridades moçambicanas não têm um argumento concreto. O que fiz foi uma decisão que tomei sozinho, que não partilhei com ninguém.

Pergunta:
Como é do conhecimento geral a República da África do Sul é alvo de propaganda muitas vezes falaciosa e muito agressiva acerca do sistema interno do país. Sendo negro, pede asilo político à África do Sul. Porquê?

Resposta:
Eu não vim para a África do Sul para me envolver nas suas actividades internas. Não estou para me intrometer nos assuntos internos da África do Sul.

Pergunta:
Não receia as atitudes raciais que provavelmente terá de enfrentar na África do Sul?

Resposta:
Quando vim para a África do Sul não sabia como é que se vivia aqui. O que sabia da África do Sul era aquilo que a propaganda anti-sul-africana dizia. Até fiquei admirado, depois de chegar à África do Sul, quando saí e vi a maneira como convivem os pretos e os brancos. A realidade entrava em choque com aquilo que a propaganda lá fora diz. É claro que eu não sei tudo acerca das relações sociais entre pretos e brancos aqui na África do Sul, porque pouco ainda vi. Mas o que já vi é a demonstração de que é mentira o que dizem lá fora.

Pergunta:
Considera-se um exilado político na África do Sul?

Resposta:
Eu pedi residência permanente na África do Sul.

Pergunta:
Faz parte de uma elite de homens bastante reduzida, é um piloto de caça-bombardeiro. Com a decisão de vir para a África do Sul nestas circunstâncias, não se ressentirá do facto de não voltar a pilotar o seu MIG-17?

Resposta:
Eu gosto da minha especialidade. Todo o piloto de caça-bombardeiro adora a sua especialidade. É algo que entra no sangue. Gostaria de continuar a voar na qualidade de piloto de caça-bombardeiro.

Pergunta:
Teve medo quando viu um Mirage ao pé do seu MIG-17 ?

Resposta:
Eu tinha visto o Mirage somente em fotografias e sabia que não era nenhum bicho do outro mundo. Quando vi os Mirages perto de mim, fiquei mais tranquilo, porque um Mirage perto de um MIG-17 é muito menos perigoso que um Mirage longe de um MIG-17.

Pergunta:
A sua saída de Moçambique, nas circunstâncias conhecidas, foi certamente um teste à sua capacidade de imaginação...

Resposta:
Eu preparei o voo. Quando vão voar, os pilotos têm de fazer um desenho da rota que vão seguir. Eu não ia, com certeza, desenhar uma rota com descolagem em Maputo e aterragem em Hoedspruít. O voo que desenhei era a rota normal para atingir o alvo a determinada hora e depois retomar a Maputo. Mas, claro, dentro do avião fiz outra rota, para sair, passar pelos pontos de mudança de rota e fazer a aterragem em Hoedspruít. Mas tudo isso foi só dentro da minha cabeça.

Pergunta:
Encontrando-se na República da África do Sul há cerca de dez dias, será tempo suficiente para poder avaliar se terá tomado uma decisão correcta?

Resposta:
Que tomei a decisão correcta, isso eu concluí ainda em Moçambique. Por tal razão vim para aqui. Agora não tenho dúvidas nenhumas.


Fontes e Bibliografia

Extensão trechos deste artigo foram publicados no livro "Africano MiGs", Publicações SHI, Viena (Áustria), 2004 (ISBN: 3-200-00088-0).
Excepto para pesquisas e materiais gentilmente cedidos pelo contribuinte no forum ACIG.org, especialmente ao Sr. Pit Weinert, as seguintes fontes de referência foram utilizados:
- "ABLAZE continente, as guerras em África Insurgency, 1960 to the Present", de John W. Turner, ISBN 1-85409-128-X, Imprensa da armadura e armas, 1998
- "GUERRAS AFRICANAS: ANGOLA E MOÇAMBIQUE 1961-1974" Osprey "homens de armas" Serie No.202, pela Abbott Pedro e Manuel Rodriguez, Osprey 1988, 1989, 1995.
- "GUERRAS AFRICANO MODERNA 3: WEST-ÁFRICA DO SUL" Osprey "homens de armas" Serie No.242, por Römer-Helmoed Heitman e Hannon Paulo, Osprey 1991.
- "O Mundo em conflito; guerra contemporânea, por John Laffin, Brassey, 1996 (ISBN: 1-85753-196-5)
- "Guerras aéreas e aeronaves; um registo detalhado de Combate Aéreo, 1945 to the Present", de Victor Flintham, Armas e Armour Press, 1989
- "Der flugzeuge NVA in Afrika", por Jürgen Roske, Fliegerrevue 6 / 92 (revista alemã), 1992



segunda-feira, 20 de maio de 2019

Joe Berardo

A LIÇÃO DE BERARDO 
(Miguel Sousa Tavares, in Expresso, 18/05/2019) 


Joe Berardo não é um chico-esperto em terra de saloios, ao contrário daquilo que ostensivamente julga. Mas também não é a ovelha negra num rebanho de gente séria. Berardo é o saloio num palco de saloios, onde aventureiros morais como ele são tratados como empresários, venerados como mecenas das artes e distinguidos como comendadores da nação. O seu feito, ao ter conseguido tudo isso e ainda devolver os mimos com que foi tratado com aquele riso alarve de quem acredita que nos comeu a todos por parvos, não é de grande monta. Foi só uma questão de estar no lugar certo no momento certo e no meio da gente certa. Hoje, quando ele (e seguramente orgulhoso) foi erigido ao estatuto de bandido-modelo da nação, o que importa questionar é o tipo de clube-nação que o permitiu. 

 O comendador, condecorado por dois Presidentes da República pelo seu mérito empresarial ou pelo contributo para a riqueza do país, jamais foi empresário de coisa alguma e jamais acrescentou um euro à riqueza colectiva. Foi sempre e apenas um especulador financeiro em benefício próprio exclusivo, que nunca criou uma empresa, uma chafarica, um posto de trabalho. Tudo isso era sabido desde sempre e foi, sabendo-o, que Eanes e Sampaio lhe puseram ao peito dois símbolos do reconhecimento pátrio — em nosso nome. Mas hoje, erigido em símbolo das malfeitorias e padroeiro dos caloteiros, e à beira de perder o seu tão estimado título de comendador, Berardo pode dizer que nem ele está só nem Eanes e Sampaio estão sós. 



 Metade, seguramente, da lista destes supostos heróis da pátria, feitos comendadores por todos os Presidentes sem excepção, são gente que de modo algum se recomenda. Metade deles foi distinguida pelos mais inconfessáveis motivos: compadrio pessoal, compadrio político, compadrio financeiro, compadrio maçónico, cunhas e pagamento de dívidas. 

 Os membros do “Clube da República”, como um dia aqui lhe chamei, dedicaram-se ao longo de décadas a nomearem-se uns aos outros para os lugares mais apetecíveis do Estado, a financiarem-se uns aos outros, a cobrirem-se uns aos outros, a negociarem uns com os outros, a criarem um sistema cruzado de impunidades e irresponsabilidades e, para finalmente enganarem os tolos, a elogiarem-se e distinguirem-se uns aos outros. No final do processo, os Presidentes da República, levados ao engano ou incapazes de resistir às pressões dos amigos do “Clube da República”, enfiaram-lhes no peito uma certidão de cidadãos exemplares, funcionando como uma espécie de indulgência plenária para eventuais malfeitorias, passadas ou futuras. 

 No caso de Berardo, o cúmulo do ambiente de saloiice geral que sempre o rodeou e cortejou foi a história da Colecção Berardo. A dita Colecção (e isto é, obviamente, apenas a minha opinião) não tem qualquer valor representativo da arte moderna. Precisamente porque ele não é um coleccionador, mas sim um empilhador de arte, o seu acervo não reflecte qualquer critério de gosto, de conhecimento ou mesmo de paixão pela arte. Mas o homem soube rodear-se de quem, devidamente contratado para tal, tratou de criar uma aura de excelência em volta da colecção que, por simples temor intelectual, ninguém se atreveu a pôr em causa. E foi assim que ele conseguiu a proeza de resolver o seu problema particular de onde guardar aquilo, à custa de todos nós. Num contrato negociado directamente entre o assessor cultural do primeiro-ministro de então, José Sócrates, e o conselheiro de arte e avençado de Berardo — (que, por incrível coincidência, eram uma e a mesma pessoa) — o “mecenas” da arte moderna portuguesa sacou nada menos do que de toda a área de exposição do CCB para guardar e expor a sua colecção sem quaisquer custos. E ainda lhe fez chamar Museu/Colecção Berardo, com entradas gratuitas, de modo a poder dizer que era o mais visitado museu português. E de novo todos se calaram, no terror de atrair sobre si a ira e o desprezo dos ditadorezinhos da nossa “crítica de arte”. Todos, incluindo o director do CCB, talvez também aliviado por não ter de se preocupar mais com a ocupação daquele espaço. E foi assim que o CCB — o mais caro equipamento cultural que alguma vez pagámos — nunca mais viu uma exposição, hipotecado que está há dez anos a servir de arrecadação e promoção pessoal do comendador. E por ali têm desfilado todos os notáveis da pátria, em ocasiões festivas de homenagem ao “mecenas”. 



 Nunca gostei de bater em quem está em baixo, mas há aqui razões para uma excepção: primeiro, porque muito disto já o tinha escrito quando ele estava em cima e, depois, porque Berardo não está em baixo: está em cima de uma dívida de 1000 milhões, que, deliberadamente e de má-fé, tornou incobrável, pavoneando-se ainda orgulhoso da sua espertice. Claro que tudo isto seria diferente se o homem tivesse o mínimo de vergonha e decoro. Se, para ele, ser apontado na rua como o rei dos caloteiros lhe causasse algum incómodo. Mas esta é a mesma pessoa que há anos enfrenta os condóminos do seu prédio e as sentenças dos tribunais, recusando-se a derrubar uma casa-de-banho clandestina que ergueu no topo do prédio, com vista de rio, invocando, sem pudor, o princípio constitucional de que “todos têm direito a uma habitação condigna”. Habitação de que, aliás, garante ser apenas arrendatário, pois que nada tem de seu, nem sequer um euro de dívidas ou até a mítica Quinta da Bacalhoa, construída pelo filho de Afonso de Albuquerque e que o Estado Português deixou ir à praça sem comprar, para acabar nas mãos deste benemérito, que logo a fez rodear de muros e cercas, como se fosse seu dono — o que, como garante, também não é. Mas Berardo é o que é e que todo o país teve ocasião de ficar a conhecer agora mais intimamente. Não se lhe pode exigir mais do que aquilo para que nasceu e de que não se envergonha, antes pelo contrário. 

 Os responsáveis maiores, os que não têm perdão, são os que o financiaram para assaltar o BCP, sobretudo os que o fizeram com o dinheiro dos contribuintes. Os que lhe deram o CCB como arrecadação privada. Os que o cortejaram, privilegiaram, promoveram e distinguiram. E os que o ajudaram, num longo, sinuoso e degradante processo de calotice transformado em forma de vida. 



 E é o espírito do tempo de um país onde somos muito rápidos a fuzilar os poderosos e ricos que caem em desgraça, mas jamais questionamos a origem do seu dinheiro e do seu poder enquanto eles estão na mó de cima. Um país onde paga mais imposto quem vive exclusivamente do seu trabalho do que quem vive da especulação. 

 Onde tantas empresas, tantos negócios e tantas fortunas não existiriam sem o favor do Estado, o dinheiro do Estado, as dívidas ao Estado. Um país onde quem esconde milhões lá fora para fugir ao fisco recebe, em o vento estando de feição, um atestado de cidadão cumpridor se trouxer o dinheiro de volta, pagando apenas 7,5% de IRS. O tal país do “Clube da República” onde se perdeu, simplesmente, o conceito de honra e a noção de vergonha. O país reflectido naquela inesquecível gargalhada com que ele nos contempla: “Ah, ah, ah!”. O país dos Berardos. 

Miguel Sousa Tavares

sexta-feira, 15 de março de 2019

Acidente do Boeing 737 Max 8 da Ethiopian Airlines

A queda do Boeing 737 Max 8 da Ethiopian Airlines





Este avião utiliza o sistema MCAS

O MCAS está localizado no nariz do avião e tem como função “sentir” a inclinação do aparelho e, se necessário, corrigir automaticamente a linha de voo. A má manutenção ou um erro destes sensores poderá levar o sistema a pensar que o avião está a subir de forma vertical exagerada, num ângulo em que o ar deixa de correr devidamente pelas asas podendo originar problemas de sustentação e, eventualmente, uma quebra estrutural.
Para impedir isso, o sistema corrige automaticamente a inclinação. Ou seja, puxa o avião para baixo, com o nariz apontado para o chão.
De acordo com o New York Times, suspeita-se que em relação ao acidente de Outubro, com um Boeing 737 MAX, os pilotos não sabiam sequer da existência deste sistema a bordo. As caixas negras revelaram que o comandante tentou corrigir, sem sucesso, a trajectória de queda, mas nunca desligou o sistema.
O MCAS foi introduzido pela Boeing nestes 737 MAX para compensar as alterações aerodinâmicas provocadas pelos motores maiores, mais potentes, mais pesados, mas também mais eficientes e económicos.
Nas fotos pode ver-se a diferença na colocação dos motores - nos modelos 737 mais antigos os motores estavam colocados praticamente debaixo das asas mas nos novos Max 8 os motores estão montados muito mais à frente, fora das asas, o que aumenta o peso na frente da aeronave.